terça-feira, 13 de abril de 2010

O roubo das bombinhas


A sala da nossa casa tinha uma porta que dava acesso ao armazém, e por onde eu muitas vezes me esgueirava pra roubar coisas como balas, bolachas ou um lápis novo. Tinha muito medo de meu pai, e tinha minhas razões pra isso, ele não era de muita conversa, se saíamos da linha, a surra era certa.
Junho estava chegando e junto com ele festas juninas, quadrilha nas escolas, fogueira, bombinhas, foguetes, pés-de-moleque e outras coisas. Pela tarde eu vi chegar um carregamento de fogos pra serem vendidos, e havia uns sacos de papel, do tamanho de um saco de pipoca com bombinhas, e isso me deixou inquieto, eu precisava de um saquinho daquele, só um era mais que suficiente, pra fazer uma gracinha com a molecada.
Nesse dia tomei banho mais cedo e fiquei de campana na sala esperando as coisas se acalmarem em casa, o armazém foi fechado os balconistas todos foram embora, e meu pai entrou em casa pra tomar o seu banho, e eu acompanhando pacientemente todos os movimentos sentadinho ali no sofá grande da sala.
Então quando tudo se acalmou, me levantei cuidadosamente e abri a porta da sala que dava pro armazém e entrei, fui direto onde estavam as bombinhas. Peguei um pacote, a facilidade era tanta que quase peguei dois, mas me contive a tempo, precisava sair dali o quanto antes com a prova do meu crime.
Quando abri a porta pra retornar pra sala e assim alcançar a porta que dava pro longo corredor que dava no portão da rua, dou de cara com minha mãe parada na porta do quarto.
- O que é isso menino? O que você está fazendo com esse pacote?
Não me lembro de ter pensado em nada na hora, só me ocorreu fugir e pra bem longe dali. Então num impulso sai pela porta que dava pro corredor numa carreira cheia de medo e arrependimento .
As ruas estavam cheias de gente, haviam barraquinhas na rua que descia da praça da matriz, e passava em frente à casa de minha vó. Mas não reparei em nada disso, meu coração batia forte, não havia muito o que fazer agora, eu tinha sido pego, que vergonha meu Deus! Fora a surra que sem dúvida nenhuma ia levar...
Ia devagar, desviando das pessoas, a alegria havia se esvaído, no lugar dela só o pânico. Mesmo no meio do burburinho de gente e do serviço de alto falante da igreja, podia ouvir meu coração batendo forte. A voz da minha mãe ecoava na minha cabeça,. Entrei num bar que havia do outro lado da rua de casa, e fiquei de pé apoiado numa mesa, tentando encontrar uma forma de diminuir o meu delito.
A essa altura meu pai já sabia da minha façanha, escapar da surra não havia como, eu tinha que voltar pra casa uma hora, ia fugir pra onde?. O saquinho de bombinhas debaixo do braço parecia me queimar as mãos, não há sensação pior que ser pego fazendo uma coisa errada. Mas eu não tive alternativa, meu pai nunca ia me dar um saco de bombinhas, ele temia que a gente perdesse um dedo soltando bombinhas, e eu precisava das bombinhas todo mundo solta bombinhas nas festas juninas e agora? Isso não ia de forma alguma justificar o meu roubo. Ainda mais de bombinhas, uma coisa proibida lá em casa. Não sei quanto tempo fiquei ali parado, trêmulo, cabisbaixo, pensando mil coisas ao mesmo tempo, acabei me esquecendo de me esconder melhor, ou de ir pra mais longe de casa, mas a culpa me manteve ali paralisado tremendo, como se quisesse ser pego, como se ser pego com mais facilidade abrandaria a ira de meu pai.
Meus pensamentos foram cortados por dois dedos firmes que agarraram a borda superior da minha orelha direita. Eu conhecia aquele toque, era meu pai, que sem dizer uma palavra foi me conduzindo assim pela orelha até em casa, passando por entre a multidão. As barraquinhas, as vozes das pessoas os gritos das crianças agora eram sons distantes, eu só conseguia ouvir as batidas do meu coração, será que não ter sequer aberto o saco de bombinhas, iria diminuir o meu castigo? Será que fazer uma cara de arrependido ia comover meu pai?
Quando entramos na sala havia visitas, mas eram minha tia irmã de minha mãe com as filhas chatas, isso não ia aliviar a minha barra, meu pai me segurou pelo braço ali mesmo na sala, e me encheu de palmadas na bunda, na frente de todo mundo. Acabava pra mim a alegria do São João daquele ano.

5 comentários:

  1. Curioso, quero saber quem eram as primas chatas.
    Deusimar

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  2. Isso não conto nem a pau! rssss
    obrigado pela visita
    Vilmar

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  3. Pô Vilmar...que criança peralta era vc hein!! Abraço!

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  4. Ah, Vilmar quanta peripécia hein...
    As festas Juninas serão sempre inesquecíveis pra ti!
    Fez-me lembrar da minhas peripécias também, já que tb fui mt peralta...
    Oh! época boa, mágica, essas que vivemos...e aprendemos, mesmo que com puxões de orelhas vez ou outra!!!
    Abraços,
    Ana Carolina e Fernando Angélico!

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  5. Ao escrever suas memórias , nos dá o previlegio de naveramos sobre suas lembrarças e mais ainda de sentimos como se fossemos a própria personagem.
    O Edmar riu bastante e disse que o puxão de orelha do Seu Geraldo é inesquecivel , ainda mais , lendo essa história de infancia.
    VOcê é imortal .....
    Magnólia

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